REVIEW 12×07 – Can You Hear Me?

Depressão, pânico, suicídio, abuso emocional… Ao expandir a mitologia dos Imortais, Doctor Who adentra o universo da Saúde Mental no episódio 12×07, “Can You Hear Me?”, cujo review pelo Universo Who você lê agora.

Tenha medo: há SPOILERS a seguir. Se eles forem seu pesadelo, saiba que, daqui para baixo… eles se tornam reais!

Neste review, vamos falar sobre:

  • Storyline e continuidades;
  • Alepo, Tahira, Chagaskas e o medo;
  • A mitologia dos Imortais, Eternos e Guardiões;
  • Zélio e Nick Minaj Zellin e Rakaya;
  • Abusadores emocionais;
  • O pânico social de Tibo;
  • O segredo de Yaz e Sonya;
  • As semelhanças entre Yaz e Rakaya;
  • Os medos de Graham;
  • O silêncio da Doutora;

Tire os dedos dos ouvidos e acorde para o mais novo review do Universo Who!

 

Storyline e Continuidades

De volta com as aberturas frias (cenas que antecedem a abertura da série), “Can you hear me?” segue os passos de “Arachnids in the UK” (episódio 4 da 11ª temporada).

Inclusive, a produção reutilizou a mesmíssima cena da TARDIS pousando do lado de fora do conjunto habitacional onde Yasmin “Yaz” Khan (Mandip Gill) mora, a mesma cena usada no episódio 4 da temporada anterior. Falta de orçamento? Acharam que ninguém fosse perceber? Poxa…

Bom, a aventura começa com a ida da 13ª Doutora (Jodie Whittaker) até Sheffield (Inglaterra) deixar os companions para retomarem parcialmente suas vidas, amarrarem suas pontas de continuidades, para que ninguém desconfie demais de suas escapulidas universo a fora.

Aí vemos alguns traços de continuidade também na série. A Doutora, solitária, decide momentaneamente avançar no tempo diretamente até o instante em que deveria pegar os companions de volta, sem fazer nada nesse entremeio. O mesmo acontecia eventualmente ao 11º Doutor (Matt Smith) e ao 12º Doutor (Peter Capaldi), quando eles precisavam deixar a então companion Clara Oswald (Jenna Colleman) em casa para continuar vivendo sua rotina pessoal. Frequentemente, eles apenas “pulavam” no tempo direto para o instante em que precisavam embarcá-la de volta à TARDIS.

Porém, em “Can you hear me?”, a história segue uma linha diferente do episódio das aranhas. A intervenção alienígena na trama dessa vez vem de fora da Terra, vem intencional e vem muito bem direcionada nos companions e na Doutora. Isso é ótimo porque, gostando ou não, as aventuras alienígenas sempre seguem o(a) Doutor(a) como inacreditáveis “coincidências” (como foi o caso das aranhas, por exemplo). No entanto, desta vez, a coincidência de termos todas as intervenções justamente na vida dos companions, de forma individualizada, foi proposital.

Estava sendo arquitetada uma armadilha para atrair a Doutora para realizar os planos malévolos de um vilão, e ninguém melhor do que nós, whovians, para saber que… NUNCA se deve usar as pessoas que o(a) Doutor(a) ama para atingi-lo(a), muito menos colocá-lo(a) dentro de uma armadilha. Erro básico que vários vilões aprenderam constantemente ao longo das 5ª e 6ª temporadas.

 

Alepo, Tahira, Chagaskas e o medo

A aventura começa em Sheffield, mas a história remonta muito tempo atrás, na antiga Alepo do século 14. Alepo é a maior cidade da Síria, no Oriente Médio. Essa cidade fica na província de mesmo nome, pois esta se formou ao redor da cidade à medida que ia se expandindo.

Cidadela de Alepo

No coração de Alepo, vemos a panorâmica da Antiga Cidade de Alepo, que hoje é tombada como Patrimônio Mundial da Humanidade.

No coração dela, está elevada a histórica “Cidadela de Alepo”. Esse local aparece na primeira cena do episódio e fica em uma área elevada em relação ao restante da antiga cidade. Na verdade, trata-se de um palácio medieval fortificado, um dos castelos mais antigos do mundo.

A colina em que ele foi construído está em registros arqueológicos de mais de 3 mil anos antes de Cristo. Hoje em dia, a Cidadela está em ruínas, pois Alepo está situada no centro de uma intensa zona de guerra. No entanto, foi dali que nasceu toda a província de Alepo que existe até hoje.

Tahira

É nessa área histórica que conhecemos a doidinha Tahira, interpretada pela cantora britânica Aruhan Galieva. Tahira é uma jovem ousada que rouba comerciantes locais para se “sentir viva”. Ela vive em um dos hospitais mais antigos do mundo, e é considerada uma paciente de “problemas mentais” (não se usava o termo “psiquiátrico” na época).

Assim, é por meio dessa personagem que somos introduzidos não somente a um dos vilões da trama como também ao cerne dramático do episódio: a saúde mental.

O primeiro drama de Tahira, além de fugir dos comerciantes de quem ela havia roubado, é ter que lidar com o fato de que ela não era levada a sério. Em outras palavras, não era “ouvida”.

Tahira tenta várias vezes explicar (e deixa claro que já tentou antes também) que há perigos reais à noite, enquanto todos dormem. No entanto, a enfermeira Maryam (interpretada pela atriz libanesa Sirine Saba) não leva Tahira a sério – ou melhor: afirma que acredita que Tahira acredite que tais criaturas sejam verdadeiras, mas só “na cabeça dela” e não na vida real.

Um dos principais problemas para muita gente que sofre de algum transtorno mental é não ser acreditado, e só ser levado a sério quando já for tarde demais. É o que acontece a Maryam e às demais pessoas do hospital, eles são atacados pelos Chagaskas.

Chagaskas

Horripilantes, os Chagaskas não são nenhuma espécie alienígena, eles são criaturas formadas a partir dos poderes extrafísicos de um Imortal, com base nos pesadelos de Tahira.

Por isso, mesmo tendo um fio do pelo de um Chagaska, a TARDIS não conseguiu ler a estrutura do material, fazendo com que a Doutora ficasse ainda mais confusa sobre a natureza daquela criatura. O Imortal os criou como parte de uma esquisita estratégia para atrair a Doutora a uma armadilha, a fim de libertar sua companheira também Imortal.

No entanto, a habilidade com que os Chagaskas foram criados foi tão perfeita e tão sobrenatural que, misteriosamente, eles permaneceram conectados à criadora original, Tahira. A jovem de problemas de saúde mental não era atacada porque ela era como “a mãe” deles ou como “a razão de ser” dos Chagaskas. Sem ela, eles não poderiam mais existir. Assim, eles nunca a atacavam diretamente, apesar de continuar assustando-a.

Vencendo o medo

A maravilhosa física com que o Imortal cria os Chagaskas também extrapola até mesmo as barreiras do tempo. Com uma ajudinha da Doutora, ela faz com que um Chagaska emita sua energia de pesadelo através de ondas temporais até que localizem, alcancem e atraiam os Imortais para a armadilha agora da Doutora para eles.

E é usando a conexão fortíssima de Tahira com os Chagaskas que o bem triunfa sobre o mal. Tahira faz um esforço mental para parar de temer os próprios pesadelos transformados em realidade e, ao dominar seus medos, eles se tornam uma poderosa ferramenta nas mãos dela.

Aqui, Doctor Who nos ensina algo mágico e muito real ao mesmo tempo, que já vem nos ensinando gradualmente desde a era do 1º Doutor (William Hartnell). A mensagem é a de que, muitas vezes, enfrentar aquilo de que temos medo talvez seja nossa única forma de nos salvar dele. Em vários momentos, diferentes encarnações do Doutor nos ensinaram que o medo pode ser um fiel companheiro, um superpoder ou uma bússola – e que, diante do medo, devemos resistir à vontade de fugir.

 

A mitologia dos Imortais, Eternos e Guardiões

Na clássica mitologia de Doctor Who, os Imortais são seres de além do tempo, de antes do Big Bang e de poderes extrafísicos, de uma natureza inconcebida pelo nosso universo. Também chamados eventualmente de Eternos (embora haja ainda certo debate sobre serem os mesmos seres ou diferentes), tivemos algumas personagens que se destacaram ao longo da história do Doutor.

O primeiro de todos foi o Celestial Toymaker (Michael Gough), o qual, na época de sua aparição, com o 1º Doutor, ainda não era considerado um Imortal pelos produtores. A intenção era de fazê-lo alguém da mesma espécie que o Doutor, ou seja, um Senhor do Tempo. Inclusive, também não existia ainda o conceito de Senhores do Tempo. Portanto, o Toymaker foi, por muito tempo, um grande mistério.

Com a evolução da mitologia clássica, os Imortais apareceram na TV e no universo expandido, especialmente representados pelos Guardiões do Tempo, na era do 4º Doutor (Tom Baker). O Toymaker foi incluso nesse grupo de seres transcendentais, e agora temos um novo Imortal em “Can You Hear Me?” mencionando esses grupos, inclusive o Toymaker.

Zellin e Rakaya

Criaturas com poderes quase “divinos”, eles são capazes de manipular a matéria do universo como bem quiserem, inclusive suas próprias formas, tamanhos, etc. A aparição deles no episódio traz novamente à tona a incompreensão do(a) Doutor(a) sobre esses seres que existiam antes mesmo do próprio tempo.

O 10º Doutor (David Tennant) se recusou a acreditar que algo pudesse existir antes do tempo, no episódio “The Satan’s Pit”, na 2ª temporada. De lá para cá, pouco foi adentrado nessa mitologia, e quase sempre no universo expandido apenas. Agora, a 13ª Doutora enfrenta Zellin (Ian Gelder) e, novamente, ela se recusa a acreditar que seja realmente “ele”.

Motivado por sua paixão por Rakaya (não necessariamente no sentido romântico da palavra), Zellin atrai a Doutora para uma armadilha, para fazer algo incrivelmente inteligente que nem ele mesmo sabia como. A Doutora, movida por seu próprio “complexo de Deus” (pertinente a todas suas encarnações anteriores) cai feito um patinho e liberta a cruel Rakaya (Clare-Hope Ashitey).

Embora não tenhamos visto seus reais poderes em prática, o episódio conseguiu criar um ambiente de medo e terror apenas pelo fato de ela estar solta no universo novamente. Sua derrota tão rapidamente resolvida frustrou muitos fãs que, assim como eu, também gostariam de tê-la visto mostrando o porquê de ser tão temida. Zellin inclusive menciona que Rakaya era ainda mais malvada do que ele próprio.

Abusadores emocionais

É importante lembrar que eles não “se alimentam” da energia do medo dos outros seres, mas sim apenas se divertem com esses sentimentos. Eles não precisam disso para existir, nem sequer enfraquecem. Apenas isso: se divertem. Esse mesmo conceito já foi utilizado nesta temporada, quando os Dregs, de “Orphan 55”, mantiveram uma vítima viva por mais tempo apenas por diversão. Essa característica é o que nos revela o caráter de maldade dessas personagens.

Novamente, podemos trazer isso para a vida real. Quando falamos em Saúde Mental, falamos muitas vezes de abuso da pessoa doente causado por amigos, colegas e familiares. Abuso emocional. Há quem se divirta nos causando medo, nos colocando nossas angústias contra nós mesmos, de forma gratuita, sem outra intenção a não ser brincar com nossos estados emocionais. Isso também é uma característica das pessoas que possuem o quadro psiquiátrico de Psicopatia.

Doctor Who também já nos ensinou que crueldade e covardia são a mesma coisa, dois lados da mesma moeda, dois aspectos de uma mesma atitude. Quando você age com crueldade para com alguém (inclusive contra si mesmo), você está ultrapassando os limites da capacidade do outro de suportar ou rebater aquilo. Automaticamente, isso faz com que um ato de crueldade seja também um ato de covardia. E vice-versa.

O abusador emocional revela, por meio da sua prática, justamente aquilo que é a fraqueza dele. Na maior parte das vezes, é a vergonha, a culpa e o medo. Portanto, a melhor forma de nos livrarmos desses abusadores emocionais é fazer o que fez Tahira: usar aquilo que eles usavam para nos amedrontar de volta contra eles.

E, por experiência própria, posso garantir: funciona!

 

O pânico social de Tibo

Apresentado pela primeira vez nesta temporada, em “Spyfall (Parte 1)”, o melhor amigo de Ryan Sinclair (Tosin Cole) é usado neste sétimo episódio para nos apresentar o dilema da Síndrome do Pânico. No entanto, só ficamos sabendo disso lá no finalzinho do episódio, quando Ryan o convence a fazer parte de um grupo de apoio.

O pânico é um estado extremo de medo irracional e injustificável de morrer a qualquer instante. Esse estado geralmente se desenvolve em pessoas ansiosas, após um gatilho emocional forte. Quando os ataques de pânico são frequentes, o caso é considerado uma síndrome e precisa de tratamento psicoterapêutico e psiquiátrico.

Um dos sintomas entre as crises de pânico é o medo de que isso se repita, que a pessoa morra sem ter conseguido pedir ajuda ou que, mesmo não morrendo, ela passe muita vergonha em público. A consequência disso é que a pessoa passa a boicotar suas próprias saídas em público, pois sabe que qualquer pequeno estado de ansiedade pode virar um gatilho para um ataque incontrolável de pânico. Há pessoas que ficam meses trancadas em casa sem ver ninguém, sem ir ao mercado ou tomar banho e, às vezes, passam dias e dias sem sequer comer.

Tibo (Willie Jonah) é relutante em receber em casa até mesmo o melhor amigo. Ele tranca demais a porta e não consegue desfrutar com tranquilidade das brincadeiras com Ryan. Logicamente, ele estava sendo manipulado pelos pesadelos de Zellin, mas a narrativa usou isso apenas para ilustrar os gatilhos de pânico de Tibo na história, já que estamos falando de Doctor Who, um misto de fantasia, ficção-científica e dramas factualmente humanos.

Após toda a aventura com a Doutora e após presenciar Tahira vencendo seus próprios medos, Tibo aceita com mais facilidade frequentar um grupo de apoio. Ele se surpreende com como outras pessoas também passam pelas mesmas dificuldades que ele. Essa empatia o ajuda a começar um processo terapêutico.

Se você sofre de transtornos de ansiedade, pânico ou depressão, busque ajuda profissional o quanto antes, por meio de um profissional de psicologia, psiquiatria ou até mesmo um médico clínico geral.

 

O segredo de Yaz e Sonya

Desde antes da estreia da 12ª temporada, o atual escritor-chefe e diretor-executivo de Doctor Who, Chris Chibnall, já havia falado que, nesta temporada, descobriríamos a história de Yaz. Na época, ele mencionou que sua escolha por viajar na TARDIS era baseada em um segredo. Em “Can You Hear Me?”, esse segredo finalmente é revelado.

Já sabíamos, na temporada 11, que Yaz sofria bullying na escola (episódio “Rosa”), sabíamos que ela estagiava para a polícia local e sabíamos que ela “queria mais” da vida dela, ao invés de resolver coisas pequenas sem muita importância (episódio “The woman who fell to Earth”).

Se nada fosse mencionado além disso, aceitaríamos tranquilamente que uma aventura na TARDIS seria suficientemente justificada pela ambição de Yaz de viver algo grande, algo que ela não encontrou na polícia. No entanto, a temporada atual trouxe outro motivador: a depressão.

Em 2017, confinada em si, uma jovem Yaz estava desitindo da própria vida, sem ânimo de continuar os dias. De repente, ela simplesmente sai a esmo, pela rodovia, longe de tudo e todos, experimentando pelo lado de fora toda a solidão que já era maior por dentro.

A irmã caçula, Sonya Khan (Bhavnisha Parmar), foi quem percebeu o comportamento perigoso de Yaz. Nesse momento, o episódio nos mostra e nos ensina a ficar atentos aos sinais da depressão e, possivelmente, do suicídio. Todos devemos saber que depressão é uma doença, assim como qualquer outra. Ela se dá lentamente, e não necessariamente acontece porque outros eventos ruins aconteceram. Não são acontecimentos ruins que causam depressão, pelo contrário, a doença é que faz parecer que eventos tristes se tornem muito mais horríveis do que realmente são.

Com medo de que Yaz cometesse “uma besteira” (esse eufemismo com que é chamada a tentativa de suicídio), a pequena Sonya liga para a polícia local. E é aí que temos, na minha opinião, a parte mais importante do episódio: como alguém pode entrar na solidão de outra pessoa e ajudá-la?

A oficial de polícia Anita Patel (Nasreen Hussain) usa a melhor feramenta: a empatia. Mesmo tendo resistência na tentativa de aproximação, Anita chama a atenção de Yaz ao conseguir descrever o que a jovem estava sentindo. Ela faz isso porque se colocou no lugar dela, inclusive chega a se sentar da mesma forma, se pondo de igual para igual. Anita diz que já sentiu o que Yaz sente e, com isso, consegue a abertura.

As semelhanças entre Yaz e Rakaya

Durante o discurso de empatia, percebemos as analogias que o episódio fez com Rakaya. A prisão da Imortal era semelhante à prisão da depressão, cujas grades são nossos próprios corpo e mente.

Também vemos a alusão ao próprio tempo. Rakaya foi setenciada à prisão eternamente, e Yaz se sentia da mesma forma. Isso porque qualquer momento se torna eterno quando sentimos desesperança. A falta de expectativa que as coisas mudem ou melhorem no futuro próximo faz com que o tempo presente se torne ainda mais longo e, muitas vezes, é isso que serve de gatilho para alguém tirar a própria vida.

Por isso, foi com inteligência que Anita deu o argumento que ganhou Yaz de volta. Ela a emprestou o seguinte pensamento: “e se isso for só um momento?”

Um momento temporário, passageiro, e só. Geralmente a depressão acontece como uma onda, ela tem seus picos altos de tristeza, solidão e desesperança, mas depois passa. As tentativas de suicídio geralmente acontecem nos picos desses sintomas. Suicidas sobreviventes (como são chamadas pessoas que tentaram e felizmente não conseguiram cometer suicídio) sabem que poucos instantes depois, a vontade passa, o impulso passa, mesmo que a tristeza não.

Foi assim que Anita conquistou Yaz. De alguma forma, Yasmin se conectou com a “suposta” ideia de que aquele sentimento terrível e silencioso pudesse sim ser só um momento, e não uma sentença perpétua. Nem mesmo Rakaya ficou presa perpetuamente. Zellin conseguia manter a esperança dela dentro daquela prisão, assim como o depressivo, mesmo no seu pico de desesperança, ainda anseia por um socorro de última hora.

A aposta final sobre as 50 libras ou os 50 centavos foi apenas uma chamada à ação para encerrar aquela situação. Na verdade, Yaz já estava conquistada pela ideia de ser só um momento.

Mais da vida

Outra sensação importante foi que, se nos permitirmos atravessar o instante da dor, sobreviver ao momento da desesperança, muita coisa boa pode vir depois disso. Três anos depois, Yaz se vê vivendo essas coisas fantásticas ao lado da Doutora e então resolve cumprir a promessa que fez com a oficial.

“Can Your Hear Me?” nos revela, por meio dessa cena, que há pedidos de ajuda silenciosos, mas que sempre é possível ouvi-los, seja por uma jovem pré-adolescente da família ou por uma pessoa totalmente desconhecida. Alguém pode estar gritando por socorro do nosso lado, e não seremos capazes de ouvi-la, se não estivermos dispostos a ouvir, a enxergar e a sentir empatia, se colocar no lugar do outro, tentar sentir o que ele sente.

É isso, dentre tantas qualidades, que faz de Doctor Who essa série que salva vidas, que salva pessoas da desesperança. É por episódios como “Can You Hear Me?” que posso acreditar com toda convicção que Doctor Who está mais vivo do que nunca, e ainda cumpre sim seus milagres pessoais.

Se você sofre de transtornos de ansiedade, pânico ou depressão, busque ajuda profissional o quanto antes, por meio de um profissional de psicologia, psiquiatria ou até mesmo um médico clínico geral.

 

Os medos de Graham

Os medos de Graham O’Brien (Bradley Walsh) vêm à tona: o retorno do câncer e a culpa por não ter conseguido salvar de um acidente a falecida esposa, Grace O’Brien (Sharon D Clarke).

Temos a felicidade do retorno da atriz, mesmo que de forma momentânea, mas pena que foi para uma cena dura. A forma seca com que ela se reporta a Graham nos faz ter essa sensação de dó para com ele. Infelizmente, era necessário. Isso nos fez construir um sentimento de quase “necessidade” de consolá-lo, ficamos ansiosos por isso.

Queremos chegar nele e dizer “Não, a culpa não foi sua. Não, o câncer não está voltando. Calma, é só um pesadelo…” Porém, o episódio exige que isso não aconteça justamente para que, depois, tenhamos uma sensação de frustração com a Doutora. Sim, isso foi premeditado.

 

O silêncio da Doutora

Feliz ou infelizmente, o episódio fecha com uma sensação de frustração muito grande por parte da audiência, que esperava ver na imagem da Doutora alguém que seria tão capaz de consolar ou de dar uma mensagem de esperança para Graham, quanto como Anita pode fazer com Yaz.

Porém, a Doutora peca miseravelmente em confortar Graham, e muita gente culpou os roteiristas e produtores da série, alegando que “o Doutor jamais seria tão insensível ou incapaz numa situação dessas”. A BBC chegou a se pronunciar oficialmente argumentando que a intenção era justamente essa: muitas vezes, a pessoa de quem mais poderíamos esperar um auxílio não vai conseguir fazer isso.

A frustração que sentimos com a Doutora, enquanto audiência, é mais comum na vida da pessoas do que imaginamos. Muitos filhos e filhas, por exemplo, que sofrem de algum transtorno depressivo, esperam apoio dos pais, da família ou dos melhores amigos, e não encontram.

A frustração que talvez você tenha sentido ao assistir à cena de Graham desabafando sobre seu medo do câncer para a Doutora é uma fagulha da real sensação de uma pessoa verdadeira quando ela desabafa com alguém de quem ela realmente esperava uma ajuda, um consolo, um conselho, um abraço.

Muitas vezes, até mesmo o(a) Doutor(a) não consegue salvar quem ama, e devemos estar preparados para perdoar as pessoas que nos amam, mas que não conseguem nos ouvir, nos entender, muito menos nos ajudar.

Se você sofre de transtornos de ansiedade, pânico ou depressão, busque ajuda profissional o quanto antes, por meio de um profissional de psicologia, psiquiatria ou até mesmo um médico clínico geral.

 

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Allons-y!

 

Texto: Djonatha Geremias (Universo Who)

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