Mary Seacole

Mary Seacole foi uma mulher de negócios, viajante internacional, autora popular e heroína na Guerra da Crimeia. Por que então nunca ouvimos falar sobre ela?

Mary Seacole

Mary Seacole was the author of Wonderful Adventures of Mrs. Seacole in Many Lands. The memoir details her adventurous life as a 19th-century entrepreneur. Seacole traveled from her home in Jamaica to Panama, England, and the Crimea (a peninsula in what is now Ukraine).

Mary Seacole escreveu “As maravilhosas aventuras da senhora Seacole em muitas terras” contendo detalhes das lembranças de sua vida aventureira como uma empreendedora do século 19. Seacole viajou da casa dela na Jamaica até o Panamá, e depois para a Inglaterra e Crimeia (península onde agora é a Ucrânia).

Viagens de Mary Seacole

Mary Seacole was inspired to travel the world by talking with British officers staying at her mother's boarding house in Kingston, Jamaica. She fulfilled that dream, first by establishing a store in Panama, then providing comfort to soldiers serving in the Crimea (now Ukraine), before settling in London, England.

A inspiração de Mary Seacole para viajar pelo mundo veio das conversas que costumava ter com os oficiais britânicos que se hospedavam na pensão de sua mãe, em Kingston, Jamaica. Para realizar esse sonho, primeiro ela abriu um armazém no Panamá, depois, dando suporte para os soldados que serviam na Crimeia, antes de se estabelecer em Londres, Inglaterra.

Mural galês

This graffiti mural, in Butetown, Wales, United Kingdom, depicts the life and wartime heroism of Mary Seacole.

Esse mural de grafite – em Butetown, País de Gales, Reino Unido – retrata a vida e o heroísmo de Mary Seacole durante a guerra.

Túmulo de Mary Seacole

Mary Seacole died at her home in London, England, and is buried at St. Mary's Roman Catholic Cemetery in Kensal Green, London. Although Seacole was born and raised in Jamaica, she always considered herself a citizen of Great Britain, as Jamaica was a British colony at the time. This beautiful gravestone was restored by the Jamaican Nurses Association in 1973.

Mary Seacole morreu em sua casa em Londres e está enterrada no cemitério da Igreja Católica Romana St. Mary em Kensal Green, Londres. Apesar de Seacole ter nascido e sido criada na Jamaica, ela sempre se considerou uma cidadã britânica, já que a Jamaica era uma colônia britânica na época. Essa linda lápide foi restaurada em 1973 pela associação de enfermeiras jamaicanas.

Quem foi Mary Seacole?

Mary Seacole foi uma ousada aventureira do século 19. Uma jamaicana mestiça que recebeu do governo da Jamaica uma homenagem póstuma da Ordem do Mérito e foi celebrada como “Black Briton” pelo Reino Unido.

Ela escreveu um livro sobre suas viagens no Panamá – onde gerenciava uma loja frequentada por homens que se deslocavam por terra para a corrida do ouro em direção à Califórnia – e suas experiências na Guerra da Crimeia, onde ela administrava um local que vendia servia comida para os oficiais. Lá, ganhou o apelido de “Mãe Seacole” pela compaixão e dedicação com todos.

Mary Jane Grant nasceu em Kingston, Jamaica, em 1805. A data exata de seu nascimento é um segredo até hoje. (Ela informou datas erradas ao censo duas vezes, dizendo que ela era cinco anos mais nova do que realmente era. O ano correto do nascimento foi retirado da certidão de óbito).

“Como uma mulher, viúva, posso ser perdoada por dizer a data certa desse evento importante”, ela escreveu em seu livro “As maravilhosas aventuras da senhora Mrs. Seacole em muitas terras”. “Mas eu não me importo de confessar que tanto o século quanto eu éramos jovens, e que ambos crescemos juntos sentindo os impactos do tempo.”

O pai de Seacole era um escocês residente na Jamaica (colônia britânica na época). Seacole chamava a mãe dela de “admirável doutora”, por causa das tradicionais ervas medicinais usadas por ela. Seacole e sua mãe gerenciavam uma pousada para oficiais em Kingston, e cuidavam dos hóspedes doentes. Ela lembra ter aprendido muito com a mãe – e com os médicos que lá se hospedavam.

Seacole também desenvolveu um desejo enorme por viagem. “Conforme eu ia crescendo e me tornando mulher, eu comecei a ceder a essa vontade que não passaria enquanto eu tivesse saúde e energia”, ela escreveu. “Eu nunca me cansava de traçar em um mapa antigo o caminho para a Inglaterra; e no caminho de volta para casa eu sempre ficava admirando os imponentes navios, desejando estar neles vendo as colinas azuis desaparecerem aos poucos.”

Ela viajou duas vezes para Inglaterra quando era adolescente, passando um total de três ano em Londres antes de ir para Bahamas, Haiti e Cuba, onde trouxe mercadorias para vender em sua cidade em Kingston. Em 1836, Mary casou com Edwin Seacole, a quem ela se refere no testamento como sendo afilhado do Almirante Lord Nelson.

Durante seu breve casamento, Edwin esteve doente e morreu em 1844, no mesmo ano da morte da mãe de Seacole. Mary não se casou novamente. Em vez disso, ela direcionou sua energia em viajar e ser enfermeira. Ela cuidou de vítimas da pandemia de cólera em Kingston em 1850, “recebi muitas dicas valiosas sobre o tratamento.”

Panamá

Seacole logo foi para Cruces, Panamá. Seu irmão gerenciava um hotel lá, e Mary passou a ter sua própria loja do outro lado da rua. Ela e seu irmão cuidavam dos garimpeiros que buscavam ouro na Califórnia.

Apesar do Canal do Panamá ainda não existir, o canal já era importante estrategicamente. Segundo o escrito por Seacole: “Entre a América do Norte e as desejadas praias da Califórnia, estendendo-se por uma estreita faixa de terra, quase não visível nos mapas e dividindo o oceano Atlântico do Pacífico. Ao cruzar esse canal, os viajantes da América evitavam uma longa, cansativa e perigosa viagem pelo mar em volta do Cabo Horn, ou uma jornada quase impossível por terra”.

Em junho de 1852, o Panamá teve um grande surto de cólera. A epidemia matou tantas pessoas que o trabalho na ferrovia do Panamá – precursor do Canal do Panamá – parou. Seacole sofreu por um tempo com a doença.

Seacole tratou muitos pacientes com cólera no Panamá. Os remédios que ela usava – incluindo um emético feito de mostarda (para induzir vômito), cataplasmas para esquentar o corpo, emplastro de mostarda no estômago e nas costas, e cloreto de mercúrio – comum entre os médicos da época, mas que depois foi descoberto ser prejudicial. Seacole confessou ter sido um erro utilizar alguns medicamentos e que estes a causavam “arrepios”.

Inglaterra

Seacole voltou para Kingston em 1853. Lá, ela leu um artigo no jornal de Londres que mudou sua vida. O jornal Times relatava a invasão da Rússia na Crimeia, uma grande península no norte da costa do Mar Negro. Nessa época, a Crimeia era controlada pelo Império Otomano (atual Turquia). O Império Otomano havia declarado guerra à Rússia.

A Crimeia era estrategicamente importante para as potências europeias e asiáticas. Quem tivesse o controle da Península também controlaria as rotas para a Índia. Em março de 1854, o Reino Unido e a França, apoiadas pelo Império Otomano, declararam guerra contra a Rússia.

Embora Seacole tenha visto regimentos que ela sabia que iriam embora, ela retornou ao Panamá para encerrar seus negócios e buscar um pouco de ouro.

No outono de 1854, Seacole viajou para Londres para cuidar de seus não lucrativos investimentos de ouro na bolsa de valores. Havia anúncios de vagas para enfermeiras na Crimeia publicados nos jornais locais, mas Seacole não se candidatou para as vagas.

No naufrágio de um navio de carga em Novembro, contudo, Seacole se interessou por “juntar-se aos antigos amigos, dos regimentos 97, 48, entre outros”, então ela “parou completamente com as especulações de ouro e dedicou todas as energias ao novo projeto”. Ela relata ter visitado vários oficiais do governo para buscar uma posição, mas foi rejeitada por todos.

A cor de Seacole pode ter sido um fator limitante para a conquista de uma posição de enfermeira na Crimeia, mas não há como ter certeza. Seacole nunca se identificou como uma pessoa negra. Também há uma série de outros fatores contra ela. Ela nunca se candidatou oficialmente, não possuía experiência em hospital e estava com idade acima da média das enfermeiras.

De qualquer forma, essa rejeição magoava Seacole. “A decepção era muito dolorosa. Eu tinha consciência de que o altruísmo das razões que me motivaram a deixar a Inglaterra – estava certa que poderia prestar meus serviços aos soldados machucados, mas, mesmo assim, eu tinha dificuldades de convencer as outras pessoas disso. Surgiram dúvidas e suspeitas surgiram no meu coração… Seria possível que os preconceitos dos Americanos contra a cor estivessem enraizados aqui? Essas senhoras não queriam aceitar a minha ajuda só porque o meu sangue fluía sob uma pele mais escura que a delas?”

Tendo seus planos de enfermeira frustrados, Seacole decidiu abrir seu próprio negócio. Para isso, teve como sócio Thomas Day, parente de seu marido. Ela o conhecia do Panamá e o encontrou novamente em Londres. Ela chegou na Turquia em março de 1885, alguns meses depois da maior batalha ter acontecido.

Crimeia

Seacole montou seu hotel Britânico entre Sevastopol e Balaklava na Crimeia, dando a ele o nome de Spring Hill. (Spring Hill é atualmente parte da Ucrânia). O hotel britânico não era um “hotel” no sentido atual da palavra. Ainda que a intenção original de Seacole fosse “um local para refeição e aposentos confortáveis para doentes e convalescentes oficiais”, na verdade ela estabeleceu uma cabana multifuncional na qual servia refeições para oficiais e soldados comuns.

Enquanto esperava sua “cabana desmoronada” ficar pronta, Seacole se hospedou em um navio no porto de Sevastopol e fornecia chá quente, bolo, limonada para os soldados que ficavam esperando no cais pelo transporte para os hospitais gerais. Como fazia muito frio, a gentileza era muito apreciada.

Parte do negócio de Seacole era fornecer lanches para o público das batalhas. Ela fez isso em três ocasiões, e, depois que as batalhas acabaram, foi se aventurar nos campos de batalha para ajudar os feridos ou confortar os que estavam morrendo.

O trabalho de Seacole como enfermeira foi quase tão celebrado quanto o de Florence Nightingale. Os jornais diziam que elas eram “As mães do Exército”. Florence Nightingale era chamada de “A senhora com a lâmpada” e Mary Seacole de “A mulher com a caneca de chá”.

Os negócios de Seacole prosperaram após a queda de Sevastopol. Durante esse período, não houve mais batalhas, mas o acordo de paz ainda dependia de negociações.

“A busca pelo prazer era incessante”, ela escreveu. E ela o encontrava em “jogos de críquete, piqueniques, jantares festivos, corridas, apresentações teatrais… Meu restaurante sempre estava cheio.” A cozinha dela vendia de tudo: sopa, peixe, curry, cremes, doces e aves.

Seacole e Day trouxeram suprimentos caros, eles esperavam que as negociações fossem levar mais tempo do que levaram. Assim que o acordo de paz foi assinado em 30 de março de 1856, as tropas começaram a se retirar. Seacole e seu parceiro não tinham como vender os suprimentos. Seacole então destruiu as caixas de vinho tinto para não ter que deixar nada nas mãos dos russos.

Novamente na Inglaterra

Depois da Guerra, Seacole recuperou o que conseguiu de seu negócio e abriu uma loja em Aldershot, uma base do Exército na Inglaterra. Também faliu.

Os amigos londrinos de Seacole retribuíram a generosidade dela durante a Guerra da Crimeia e se organizaram para ajudá-la a pagar as dívidas. Não foi o suficiente. Para arrecadar dinheiro, Seacole escreveu ‘As maravilhosas aventuras da senhora Seacole em muitas terras’.

Publicado em julho de 1857, o livro foi uma das primeiras biografias publicadas por uma mulher negra. Escrito pensando em um público sedento por histórias da Guerra da Crimeia, o livro foi um sucesso. Rapidamente teve uma segunda edição.

A rainha Victoria, o futuro rei Edward VII, e seu irmão o Duque de Edinburgh ajudaram com um segundo “Fundo Seacole”. Esse financiamento permitiu que Seacole tivesse uma renda confortável pelo resto de sua vida.

Seacole morreu de derrame em 14 de maio de 1881 aos 76 anos. Faleceu sendo uma mulher rica e deixou muito de sua fortuna para sua irmã na Jamaica.

Lembrando Mary Seacole

Durante toda a vida de Seacole, a Jamaica fez parte do Império Britânico e, por isso, ela se considerava uma cidadã britânica. No entanto, apenas o povo jamaicano a mantém vida em sua memória.

Em 1954, no aniversário de 100 anos da Guerra da Crimeia, a Associação Geral de Treinamento de Enfermeiras Jamaicanas (atualmente Associação de Enfermeiras Jamaicanas) batizou sua sede de Casa Mary Seacole. No início da década de 1970, o grupo restaurou sua lápide no cemitério da Igreja Católica Romana St. Mary em Kensal Green, Londres. Há uma ala chamada Mary Seacole no Hospital Geral de Kingston. Em 1990, foi homenageada com a Ordem do Mérito Jamaicano, a terceira maior honra no país.

No Reino Unido, também, organizações têm reconhecido a importância das aventuras de Mary Seacole para a história. Em 1981, 100 anos após a morte dela, foi realizada uma cerimônia (ocorrendo anualmente desde então) em seu túmulo em Londres. Em 2003, uma pintura de Seacole foi encontrada em uma feira de usados e agora está pendurada na National Portrait Gallery.

Foram emitidos selos comemorativos em sua homenagem, tanto pela Jamaica quanto pelo Royal Mail do Reino Unido. Neles, há uma imagem dela usando medalhas – as quais, entretanto, ela nunca recebeu (medalhas eram dadas apenas para os militares).

Em 2004, mais de dez mil pessoas votaram em Mary Seacole como “A maior britânica negra”.

“Algumas pessoas, de fato, já me chamaram de uma versão feminina de Ulisses” – Mary Seacole

“Não tenho vergonha de confessar a gratificação que é, no final das contas, egoísta. Eu amei ajudar aqueles que precisavam de uma ajuda feminina. E não importa a distância, onde quer que haja necessidade de ajuda, eu não peço nada mais nada menos do que  poder resolver isso.” – Mary Seacole

 

Livro: University of Pennsylvania: Wonderful Adventures of Mrs. Seacole in Many Lands

Traduzido de: National Geographic

 

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